quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A maldição do petróleo contra o discurso ufanista dos petralhas. Ou:"Abundância de recursos naturais não garante desenvolvimento de países"(FT)

De onde vem o crescimento? Por que alguns países emergem e se tornam desenvolvidos enquanto outros naufragam antes de atingir esse estágio?
Alguns candidatos no passado vistos como improváveis emergiram e se tornaram economias poderosas. A Coreia do Sul em duas gerações evoluiu de economia camponesa devastada pela guerra a membro pleno do clube dos países desenvolvidos. Outros países que ocupavam posições muito melhores tropeçaram.
Não é simplesmente uma questão de recursos naturais ou de sistemas educacionais. Pesquisas conduzidas por Ricardo Hausmann, da Universidade Harvard, sugerem que o crescimento é "propelido pelo conhecimento" --ao nível da sociedade, não do indivíduo.
A primeira questão envolve o que uma sociedade sabe como fazer. A segunda envolve determinar se esse know-how pode ser aplicado a novas áreas. Se pessoas já são competentes em uma área, há outros setores ao quais essas competências poderiam ser aplicadas facilmente?
A pesquisa envolvida resultou no chamado "Atlas da Complexidade Econômica" (uma versão resumida do qual pode ser lida em www.ft.com/authersnote), e examina como o know-how forma agrupamentos intersetoriais. Grandes grupos se formam em torno da indústria têxtil --o ponto de partida para o sucesso de muitos mercados emergentes--, e da construção, maquinaria, produtos químicos e eletrônicos. Todas essas atividades requerem capacitações facilmente transferíveis a outros setores.
Já outros agrupamentos, menos centrais, envolvem os recursos naturais. Países abençoados com petróleo ou riquezas minerais podem se sair bem por algum tempo. Mas as indústrias extrativas não envolvem conhecimentos facilmente transferíveis a outras atividades. A menos que os países deliberadamente criem novas áreas de especialização com o dinheiro gerado por seus recursos minerais, sofrerão recuos quando o dinheiro gerado por esses setores acabar.
Por isso, Hausmann é partidário da tese da "maldição do petróleo". Os líderes de países que podem tirar do subsolo toda a riqueza de que precisam tendem a sofrer de complacência e a postergar as reformas necessárias.
Isso pode explicar por que a Coreia do Sul, dotada de pouca riqueza mineral, cresceu tão rápido, enquanto o México, dotado de reservas de petróleo que pareciam estar entre as maiores do mundo nos anos 70, caiu na estagnação.
O passo seguinte é identificar os países que estão em melhor posição para melhorar. Os vencedores nesse quesito contrariam a sabedoria do mercado.
O México, um dos países que apresentou baixo desempenho econômico na última geração, é a economia latino-americana mais bem posicionada para crescer. O Brasil, até recentemente muito querido dos investidores, mostra resultados medíocres. Por quê?
A posição do México é melhor, de acordo com Hausmann, porque o país se diversificou, para a aeronáutica, tecnologia da informação e assim por diante. Depois que as crises financeiras dos anos 80 e 90 mostraram que não era possível viver só de petróleo, o México investiu em companhias industriais e montadoras em sua fronteira com os Estados Unidos.
Era uma jogada nada sutil que envolvia o uso de mão de obra barata para montar componentes importados, em seguida reexportados em formato final para o lado oposto da fronteira. Mas estamos falando de setores bem conectados, e com a capacitação que eles propiciaram o México pôde se diversificar para outros setores, da fabricação de carros à eletrônica, e a cuidar de outros estágios do processo de produção.
O Brasil se concentrou no setor de recursos, liderado pela soja e pela mineração.
"O Brasil cresceu notavelmente pouco, no contexto dos preços muito altos que vigoravam para as commodities", diz Hausmann. "Se os preços das commodities ficarem onde estão ou caírem, a capacidade de crescer do Brasil dependerá de sua capacidade de diversificação e de desenvolver produtos mais complexos. O Brasil não está bem posicionado para isso".
As previsões quanto ao resto do mundo também contrariam a intuição. Na África subsaariana, o país mais bem posicionado para crescer é o Zimbábue.
"Se você presumir que a biologia vai remover o principal obstáculo, ou seja, o presidente Mugabe, o país conta em sua sociedade com know-how que poderia ser expresso em forma de níveis mais altos de renda", disse Hausmann.
Tunísia e Egito, a despeito dos tumultos causados pela Primavera Árabe e suas consequências, parecem locais promissores em termos de crescimento. Já o Catar, candidato perfeito a tornar a vítima perfeita da maldição do petróleo, não.
"É improvável que o petróleo seja fonte adicional de crescimento, e com isso o restante da economia não tem muito que a ajude", diz Hausmann.
Quanto à China, a boa notícia é que a equipe de Hausmann a considera bem posicionada para crescer. A má notícia é que sua previsão de crescimento para o resto da década, de 4,5% a 5% anuais, indica recessão em algum momento. Já que a interpretação convencional da economia aponta crescimento anual médio de 7,5% para a China, o que socorreria o resto do mundo, isso não é bom. Para muita gente, um crescimento inferior a 5% para a China seria o equivalente de uma aterrissagem dura.
Mas o cálculo de Hausmann parece justo.
"Eles precisam reduzir seu nível de investimento de 46% para algo mais razoável, e é difícil fazê-lo sem um período de crescimento muito lento ou negativo", ele afirma.
Assim, considere-se avisado. Para mitigar o efeito de uma desaceleração na China, o melhor talvez seja buscar no mapa de Hausmann países que contrariem as intuições e mesmo assim estejam posicionados para crescer.

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