sábado, 12 de abril de 2014

No pior dos mundos: o governo cortou a Selic imaginando que juros baixos não trariam inflação. Agora há preços represados, juros altos e incertezas (RS)

TUDO PARA CIMA -- Sobem os juros, a inflação continua em alta, o déficit público aumenta... Só o crescimento continua medíocre
TUDO PARA CIMA — Sobem os juros, a inflação continua em alta, o déficit público aumenta… Só o crescimento econômico continua medíocre
Reportagem publicada em edição impressa de VEJA
O governo de Dilma Rousseff prestou uma inestimável contribuição para os estudos econômicos. Usou o país de cobaia e o submeteu a um experimento destinado a comprovar a hipótese segundo a qual uma redução abrupta na taxa de juros não teria efeitos sobre a inflação.
Julgava, dessa maneira, colocar contra a parede todo o conhecimento sobre política monetária acumulado nos últimos quarenta anos. Resultado do teste de laboratório: a hipótese é completamente furada.
Na concepção da equipe econômica e de seus colaboradores, a economia brasileira estaria preparada para funcionar em um ambiente de juros mais baixos, similares aos de países desenvolvidos.
Sob essa premissa, a taxa básica, a Selic, foi derrubada rapidamente no fim de 2011 e em 2012, chegando a 7,25%, o menor valor já registrado. Mas a inflação começou a subir ainda mais, distanciando-se do centro da meta de 4,5% ao ano. O governo custou a dar o braço a torcer e tentou conter a escalada dos preços lançando mão de expedientes tão antiquados quanto ineficientes, entre eles o controle dos preços dos combustíveis e a manipulação de tarifas.
A inflação, apesar do represamento de reajustes, permaneceu teimosamente elevada. Só então o Banco Central voltou a subir os juros. Na semana passada, a taxa Selic foi elevada para 11% ao ano – acima, portanto, dos 10,75% herdados por Dilma.
Juros mais altos, subsídios, contas públicas sendo arruinadas…
O país acabou no pior dos mundos. O governo desestruturou o arcabouço que dava base à estabilidade econômica sem com isso ter alcançado o seu objetivo de reduzir, de maneira duradoura, a Selic. O novo ciclo de alta deixou a taxa básica maior do que era no fim de 2010, carregando para cima os juros bancários cobrados dos consumidores e das empresas.
A inflação, nos anos Dilma, não ficou em nenhum momento no centro da meta oficial de 4,5% e ameaça estourar mais uma vez o limite superior, de 6,5%. Isso mesmo com o adiamento nos reajustes dos combustíveis e da eletricidade.
Ao mesmo tempo, os subsídios distribuídos para sustentar os bancos públicos e segurar as tarifas de energia estão arruinando as contas públicas, para não falar no choque nas finanças da Petrobras e da Eletrobras. Por fim, o déficit nas contas externas se aprofundou, deixando o país mais vulnerável a capitais especulativos. Todas essas dificuldades resultaram exclusivamente das ações de governo, e não foram obra de crises externas, como no passado.
Na avaliação do economista Mário Mesquita, sócio do banco Brasil Plural e ex-diretor do BC, o governo parece ter se esquecido de que a inflação é um efeito monetário, ou seja, inevitavelmente aumenta quando existe mais dinheiro em circulação.
De acordo com Mesquita, não fossem as interferências no valor das tarifas e no preço dos combustíveis, a inflação já estaria rodando acima de 7%.
“A queda nos juros não foi amparada pela política fiscal”, diz Mesquita. “As despesas públicas aumentaram, e houve também expansão dos gastos parafiscais.”
Por “parafiscais” entendam-se os fartos financiamentos liberados pelos bancos públicos nos últimos anos, que, por determinação do governo, mantiveram os cofres abertos, tornando ainda mais difícil a tarefa do BC de conter as expectativas de alta inflacionária.
“Certamente, a deterioração dos indicadores tem mais a ver com os erros da política econômica do que com a crise global”, afirma Mário Torós, sócio da Ibiuna Investimentos e também ex-diretor do BC. “A atividade econômica está de fraca para fraquejante. Existe uma grande probabilidade de a inflação ficar acima do teto da meta, e em 2015 teremos um ano complicado, com o inadiável reajuste de energia, transportes e combustíveis. A tudo isso se junta uma possível crise energética. A alta recente nos juros não foi suficiente para reduzir as expectativas em relação à inflação futura.”
O experimento do governo serviu para atestar a debilidade da hipótese inicial, mas o preço do equívoco será pago por um bom tempo. A confiança na trajetória da economia ruiu, e o efeito foi o desincentivo aos investimentos e a queda no crescimento.
Quanto mais a inflação demorar a ceder, maior o estímulo para a reindexação de preços, o que torna o seu combate mais difícil.

Nenhum comentário:

Postar um comentário