segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Carne para leões (MILTON SIMON PIRES)


Para esta escória, é interessante que vocês briguem. Que vocês se ofendam e persigam uns aos outros. O PT é uma organização criminosa que percebe muito bem os conflitos entre nós. Ele explora tudo isso.

Há mais de 20 anos, ainda um estudante de medicina, fui co-autor de um artigo intitulado “Aspectos Inconscientes do Ensino Médico”. Trabalho medíocre e sem qualquer repercussão, jamais imaginei que algum dia eu voltasse a pensar sobre ele. Na época eu era um marxista ferrenho. Na bibliografia citava, dentre outros, Herbert Marcuse e o seu “Eros e a Civilização” como fonte inspiradora. Minha ideia era discorrer sobre os sentimentos de culpa e vergonha infligidos ao estudante de medicina durante a sua formação – coisa que continua até hoje, mas que sem dúvida nenhuma passou a ser manobrada politicamente de forma magistral.
Não sei se existe uma faculdade em que possa haver uma competição maior entre os estudantes. Nunca fiz (e era meu sonho fazer filosofia) outra depois da medicina. Outro dia, conversando com um amigo, eu me recordava de uma cena marcante, ainda lá nos anos 80, em que testemunhei colegas (futuros médicos) arrancando das paredes do antigo Instituto de Biociência da UFRGS os avisos sobre as vagas e datas de prova para os concursos de “monitoria”. Todo mundo queria ser monitor de alguma cadeira da faculdade: pontos no currículo, dinheirinho para cerveja, prestígio com a mulherada... enfim: razões não faltavam. 1989 era um “esquizofrênico pra mim”. Primeira eleição para presidente da república depois de décadas, Muro de Berlin desmoronando, massacre da Praça da Paz Celestial na China e uma greve dos professores do ensino superior que nos deixou semanas (ou meses? Confesso que não lembro mais...) parados aqui em Porto Alegre. Entre decorar todos os ramos do plexo radial e uma passeata ao lado de Lula eu literalmente “tomava todas” sem conseguir entender como deveria me sentir apoiando no Brasil uma ideia que desmoronava no mundo inteiro. Eu não tinha, ainda, lido Millor Fernandes e a sua “Bíblia do Caos” para saber que “quando uma ideologia fica bem velinha e quer se aposentar; vem morar no Brasil”. Mas tudo isso são lembranças. Não foi para isso que comecei o texto.
Escrevo aqui para todos os estudantes de medicina do Brasil petista em 2014. Não tenho uma ideia exata de como deva me dirigir a vocês. Sempre detestei aquela coisa de “vocês são o futuro” que jogavam para cima da gente na faculdade. Ao mesmo tempo, como todo bom paranóico, eu prenuncio as críticas dos futuros psiquiatras ao lerem tudo isso pensando: “coitado, é um frustrado que agora quer tirar a esperança da garotada”. Pois bem, “garotada”, eu sequer sei se os mais lúcidos de vocês tem alguma esperança que possa ser “tirada” por mim. Quem tira a esperança das pessoas no Brasil é a classe política, e político eu jamais fui, nem pretendo ser. Escrevo para vocês como quem cumpre uma obrigação: sem esperar nada em troca. Cabe a mim, depois de quase 20 anos de profissão, ex-petista fanático e “trabalhador da saúde” (como a ralé comunista gosta de chamar os médicos brasileiros) pedir que se afastem de todo e qualquer tipo de “movimento estudantil”. Não percam tempo com UNE, DCE, centros acadêmicos, ou seja lá o que for. Essa gente é a escória da profissão! Foi desse tipo de coisa que nasceram “marginais do poder” como Alexandre Padilha e tantos outros médicos que hoje fazem da nossa profissão um lixo. Estudem tudo que puderem e tratem seus colegas de forma melhor do que eu tratei. Senão por uma questão de caridade; por uma questão tática.

Para esta escória, é interessante que vocês briguem. Que vocês se ofendam e persigam uns aos outros. O PT é uma organização criminosa que percebe muito bem os conflitos entre nós. Ele explora tudo isso. Treina pessoas para se aproveitarem disso ensinando-lhes a prática da denúncia. Dos memorandos e das comunicações internas que qualquer um de vocês, hoje doutorandos, conhecem melhor do que eu.
Não aceitem que a vida de vocês seja dirigida por essa gente que, como eu e milhares de médicos hoje mais velhos do que vocês, permitimos que tivesse acontecido. Estudem tudo que for possível. Façam estágio fora do Brasil. Pensem inclusive em ir embora do país para sempre e, se decidirem ficar aqui busquem a iniciativa privada. Afastem-se o máximo possível desse sistema público imundo. Desse SUS que espera a formatura de vocês a cada fim de ano, ansioso, dessa máquina de humilhar médicos que vigia vocês: a carne fresca da nossa profissão, cheia de fé e esperança, carne para os leões.

Dedicado aos estudantes de Medicina da Universidade Gama Filho.
Porto Alegre, 25 de janeiro de 2014.


Milton Simon Pires
 é médico cardiologista.

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