
Essa inversão projetiva – talvez o mais clássico sintoma da histeria -- é minha velha conhecida. Uns dez anos atrás, um grupo de moleques enfezados criou no Orkut uma comunidade de nome “Nós odiamos o Olavo de Carvalho”, onde espalhavam a meu respeito as histórias mais medonhas, me atribuíam toda sorte de crimes e baixezas e vasculhavam a vida da minha família em busca de pecados escabrosos. Tudo, é claro, sob o pretexto de “debate democrático”, com o direito suplementar de queixar-se de “ataques ad hominem” quando, uma ou duas vezes numa década, eu lhes dava um minuto de atenção e os mandava pastar. Quando a virulência da coisa chegou ao nível da loucura pura e simples, trocaram o nome da página para “O Olavo de Carvalho nos odeia”, para dar a impressão de que era eu, de algum modo misterioso, o autor das suas ações, a fonte misteriosa do ódio que despejavam sobre mim.
O caso, em si, não tem a mais mínima importância, mas, se isso não tivesse me acontecido, talvez eu não compreendesse tão claramente quanto compreendo hoje o mecanismo psicopatológico que inverte o sentido do cumprimento natalino e lhe atribui uma intenção odienta no ato mesmo de cobri-lo de ódio.
O mesmo mecanismo está em ação, é óbvio, quando alguém ateia fogo numa igreja, urina no altar, bolina uma criatura do seu mesmo sexo durante a missa ou enfia um crucifixo no ânus para provar, com lógica insuperável, que o cristianismo é uma “religião de ódio”.
Como o raciocínio histérico se disseminou na nossa sociedade ao ponto de servir de modus argumentandiexemplar e obrigatório em teses universitárias, debates parlamentares e opiniões eruditíssimas expressas em artigos de jornal, é previsível que em breve o sentido insultuoso da expressão “Feliz Natal” será consagrado em lei e essas duas palavras só poderão ser ditas em recinto fechado, entre pessoas que tenham previamente assinado um disclaimer isentando de qualquer responsabilidade penal o desalmado que ouse pronunciá-las.
Por enquanto isso é só uma tendência, uma possibilidade que talvez possa ser afastada. Mas certamente não o será se os cristãos, antecipando-se servilmente aos planos do opressor, consentirem em limitar-se ao genérico e vazio “Boas Festas” para não ferir suscetibilidades fingidas.
Portanto, aqui vão os meus votos: Feliz Natal para todos, aí incluídos os que não o desejam.
Publicado no Diário do Comércio.

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