domingo, 26 de outubro de 2014

O meu voto vai para a democracia (SILVIO MEDEIROS)


Nenhuma democracia foi projetada para sobreviver décadas a fio sem alternância de poder.

A democracia é uma invenção mesmo fascinante. Partindo do pressuposto de que o poder corrompe, é uma forma de governo desenhada para que a concentração de poder seja evitada e para que o consenso público seja alcançado em busca do bem comum. Ela começou a tomar a forma que hoje conhecemos há 800 anos, com o surgimento da Magna Carta na Inglaterra.

A idéia de que uma Constituição deveria existir para limitar os poderes do rei mudou a forma como as nações iriam encarar as instituições e os indivíduos. Não! Um rei não tem o direito de prender um cidadão sem um mandato judicial, de confiscar os bens de um indivíduo arbitrariamente ou de prejudicar a liberdade de um comerciante.
Nossas democracias atuais nascem como uma tentativa de proteger a nação contra o poder de quem a deveria defender em primeiro lugar, criando um complexo sistema de pesos e contrapesos que, praticamente, deveria anular a tentativa unilateral de se decidir e impor uma visão centrada apenas no auto-interesse do governante.

O senado americano se inspirou na Câmara dos Lordes, a Casa dos Representantes se inspirou na Câmara dos Comuns, o Presidente se inspirou no Rei e a Constituição se inspirou na Magna Carta. E todos os outros países do Ocidente se inspiraram no modelo norte-americano.

Infelizmente, por aqui, a nossa Democracia Republicana já começou da forma mais tosca possível, aplicando um golpe de Estado contra o maior estadista da nossa história, Dom Pedro II, expulso do país, na calada da noite, num barco sujo; e deixado para viver e morrer de favores no velho continente.

De lá para cá, pouca coisa melhorou. É quase um milagre pensar que depois do populismo fascista de Vargas, da megalomania de JK, dos arbítrios delirantes de Jango, dos abusos do regime militar, das baixezas de Sarney e Collor, no Brasil se tenha preservado 3 poderes (mais ou menos) independentes, imprensa (mais ou menos) livre, instituições (mais ou menos) autônomas e mercado (mais ou menos) livre. Não fosse a tenacidade da nossa gente, isso aqui tinha tudo para ser uma terra devastada.

É por isso que as eleições presidenciais de 2014 se tornam, de certa forma, as eleições mais importantes da nossa história republicana. Nelas, os brasileiros não irão somente se decidir pelo preço do ônibus ou pela enigmática autonomia do Banco Central, mas irão decidir qual a interpretação que a palavra “democracia” realmente tem por aqui. Se votarem pela mesmice, estarão dizendo que democracia não é um governo representativo, com poderes limitados, feito de forma consensual e em busca do bem comum, mas que é um projeto de poder sem fim, centralizado, autoritário e que tem como única finalidade a preservação do “status quo”.

Por que digo isso?

Com 16 anos de indicações de ministros para o STF, diga adeus à independência no Judiciário. Com 16 anos de trocas de cargos técnicos por cargos indicados em empresas estatais, por parte do mesmíssimo governo, diga adeus à eficiência e à transparência nos serviços públicos. Com 16 anos de controle sobre verbas publicitárias bilionárias, diga adeus à liberdade de mídia. Com 16 anos de controle rígido ideológico sobre a grade escolar, diga adeus à liberdade curricular.

Nenhuma democracia foi projetada para sobreviver décadas a fio sem alternância de poder, porque é fácil demais fazer do fim de um governo o próprio governo e não o povo, os cidadãos.

Sem alternância de poder, sem alternância de ideologia, corre-se o risco enorme de termos um Partido se confundindo com a própria idéia de Estado, e depois ver esse Partido-Estado se confundindo com a natureza de uma Nação. Sem alternância e limitação de poder, temos qualquer coisa, menos democracia.

Nestas eleições, o Brasil precisa lembrar ao prefeito Haddad que ele não pode usar a coisa pública em favor do seu partido, como fez esta semana, pendurando bandeiras da candidata Dilma na sede da Prefeitura.

Nestas eleições, o Brasil precisa lembrar a direção do PT de Minas Gerais que eles não podem se utilizar dos Correios a favor do seu partido, transformando carteiros em cabos eleitorais.

Nestas eleições, o Brasil precisa lembrar a candidata Dilma que nordestinos e paulistas não são massa de manobra para serem colocados como inimigos no pior estilo
de luta de classes – e que programas assistenciais não foram feitos para serem usados como chantagem eleitoral.

Precisamos lembrar ao mundo que o Brasil não é um Partido – nem pertence a um Partido.

Pode-se alegar que o PSDB governa o Estado de São Paulo há muito tempo. É verdade, e também isso deveria ser um sinal de alerta. É claro que isso fomenta o surgimento de ineficiência, de corrupção, de oligopólios, o que nunca é desejável. Um político não pode se sentir confortável demais na cadeira de onde governa.
Contudo, é preciso saber diferenciar um Governo de Estado de uma Presidência da República, com alcances e impactos incomparavelmente distintos.

Pessoalmente, não gosto e nem compactuo com a ideologia social-democrata tucana, que tende a inchar demais o governo, a intervir demais no mercado, a capitalizar demais sobre as mazelas sociais. Mas neste momento, em termos de Presidência da República, o PSDB se tornou a única alternativa se quisermos devolver a palavra “democracia” à sua original significação. Além de ser um partido com muito menos envolvimento em casos de corrupção (e quando descobre culpados não glorifica esses criminosos), muito menos imoral (vide essa campanha eleitoral e destruição das reputações de Marina e Aécio) e autoritário do que o PT.

O meu voto vai para a alternância de poder, para a sobrevivência da democracia. Vai para Aécio Neves.

Nenhum comentário:

Postar um comentário