Na quinta-feira da próxima semana haverá o referendo que decidirá se o Reino Unido sairá ou não da União Europeia.
Essa saída do Reino Unido tornou-se popularmente conhecida como "Brexit" — o termo "Brexit" é uma conjunção deBritain, de Grã-Bretanha, com exit, que significa saída.
Quais seriam as repercussões dessa saída?
Regulamentações
Para começar, o Reino Unido imediatamente estaria livre das onerosas regulações que são continuamente e vorazmente promulgadas pelos burocratas do Parlamento Europeu.
Qualquer pessoa familiar com a
história do "Mercado Comum" europeu — ou "Comunidade Econômica Europeia", como costumava ser chamado — sabe que tal arranjo sempre foi um esquema para proteger e privilegiar determinados e poderosos grupos de interesse na Europa. Dentre os grupos privilegiados com fartos subsídios e protegidos por tarifas de importação sobre os produtos de fora da Europa, destaque para o setor agrícola, especialmente o da França.
Ironicamente, esse arranjo da União Europeia sempre foi promovido sob o rótulo de "livre comércio", dado que quem é membro da União Europeia tem de abrir suas fronteiras para todos os outros países que também são membros. No entanto, isso ocorre à custa do comércio com o restante do mundo, pois os elevados níveis de burocracia, regulação e protecionismo estipulados pela Comissão Europeia em Bruxelas amarra as mãos dos países-membros que querem fazer comércio com a Ásia e com as Américas.
Não apenas os consumidores da União Europeia têm de lidar com um maior custo de vida — principalmente no que diz respeito ao preço dos alimentos — por causa das barreiras ao comércio com o resto do mundo, como também as indústrias lidam com maiores preços para seus insumos, como as indústrias que utilizam aço importado de fora da Europa e que, por isso, têm de pagar as tarifas de importação. Isso torna os produtores da União Europeia menos competitivos e, consequentemente, menos inovadores que os do resto do mundo. Como muito bem colocado pelo documentário
Brexit — The Movie, "você só cria barreiras ao comércio porque há algum estrangeiro vendendo um produto melhor e mais barato".
Igualmente, a natureza altamente reguladora da União Europeia impôs um fardo sobre o empreendedorismo nos países-membros. (Tornaram-se mundialmente famosas as
absurdas e
enciclopédicas regulamentações sobre a abobrinha e o chuchu). Após décadas de afiliação do país aos ditames da União Europeia, abrir uma pequena empresa no Reino Unido tornou-se mais difícil e oneroso do que jamais fôra em toda a sua história. O furioso ataque de regulamentações e leis oriundas de Bruxelas tornou incrivelmente difícil para as pequenas empresas inovarem e crescerem, criando assim uma economia que favorece as grandes empresas já estabelecidas, protegendo-as da potencial concorrência de novos entrantes.
Obviamente, sob este arranjo, as grandes empresas estão totalmente satisfeitas em ter burocratas em Bruxelas prontos para esmagar qualquer concorrência que possa eventualmente surgir. Como nota o documentário supracitado, "as grandes corporações adoram a União Europeia porque ela cria regulamentações que destroem seus concorrentes menores".
Livre comércio
Ninguém precisa de acordos comerciais promulgados por burocratas para que as pessoas de um país possam comercializar com pessoas de outros países. Os defensores do livre comércio de outrora, como Cobden e Chevalier, sempre se opuseram
a acordos comerciais feitos por políticos. Tudo o que é necessário para que o livre comércio ocorra é uma inação da parte do estado.
No entanto, inação do estado é exatamente o oposto do DNA da União Europeia.
Nesse quesito, não há nenhum aspecto negativo quanto à saída do Reino Unido, pois ninguém está falando em expulsar o Reino Unido da Europa e de sua área de livre comércio. Ninguém em Bruxelas está afirmando que o Reino Unido sairá do mercado comum europeu — que vai desde a Islândia (que não é membro da União Europeia) até a Turquia (que também não é membro da União Europeia) — caso saia da União Europeia.
Todo o argumento dos defensores da permanência se resume a dizer que há empregos no Reino Unido que "dependem do nosso comércio com a União Europeia", o que significa dizer que "dependem da afiliação do Reino Unido à União Europeia".
O fato é que a prática de um genuíno livre comércio independe de afiliação a alguma zona aduaneira. Os eventuais benefícios comerciais de se pertencer à UE são pequenos em comparação aos maiores benefícios que podem ser alcançados fora da União por meio da liberalização unilateral do comércio. Com efeito, não há necessidade nem de acordos bilaterais e nem de multilaterais entre países, uma vez que a eliminação de barreiras ao comércio não precisa de ser recíproca para que a população do país usufrua todos os benefícios do livre comércio.
Se o Reino Unido sair do mercado comum da UE, tudo o que o país tem de fazer para alcançar um genuíno acordo de livre comércio — aliás, isso vale para qualquer país — é passar uma ínfima legislação declarando simplesmente que:
Por meio desta, o governo [insira o nome do gentílico] elimina todas as vigentes barreiras, restrições e proibições à livre e irrestrita exportação e importação, compra e venda, de todos os bens e serviços entre [nome do país] e toda e qualquer nação do mundo. O governo [insira o nome do gentílico] declara que todas as formas pacíficas e não-fraudulentas de comércio e troca são questões exclusivas do foro privado de cada indivíduo, e dizem respeito apenas aos cidadãos do [insira o nome do país] e do resto do mundo envolvidos na transação. Esta lei entra em vigor imediatamente.
Se isso acontecesse, os importadores e exportadores de todo o mundo alegremente fariam comércio com o Reino Unido — como já fazem com Hong Kong, que não possui nenhuma barreira às importações.
Mas, como já
dizia Mises, acordos comerciais feitos por governos sempre visam a estimular as próprias exportações e a tolher as importações. O protecionismo é a regra dentro da UE: os interesses políticos deletérios ao livre comércio sempre encontram apoio entre os países-membros, e os grandes grupos empresariais e agrícolas estão continuamente clamando por ainda mais intervenções sobre o comércio.
Nesse sentido, o mercado comum da UE nada mais é do que uma bem-organizada camarilha de burocratas protecionistas que gostam de posar de defensores do livre comércio.
Sem dúvidas, o comércio é muito mais livre fora dessa organização.
Ademais, para os defensores da permanência, a coisa se complica quando se observa que os dois países mais ricos da Europa nunca fizeram parte da União Europeia: Suíça e Noruega. Isso vem fornecendo mais um argumento poderoso para os defensores da saída do Reino Unido. "Você quer deixar de fazer parte da União Europeia, assim como os dois países mais ricos da Europa?"
Imitando a Suíça
Os suíços, obviamente, sempre praticaram um amplo comércio internacional e usufruem um padrão de vida que regularmente os coloca entre os três maiores do mundo. Mais ainda: os suíços possuem um amplo comércio com a União Europeia sem jamais ter sido membro do arranjo. E, dado que a UE se baseia majoritariamente em proteger as indústrias européias da concorrência não-européia, os suíços estão em uma melhor posição em termos de liberdade de comércio que seus vizinhos.
Politicamente, a Suíça também oferece uma dicotomia extremamente interessante em relação à UE. A UE é uma organização secreta e totalmente isolada do povo europeu, o qual não detém absolutamente nenhum poder de supervisão sobre ela. A UE não é gerida por pessoas eleitas. O próprio Parlamento Europeu é totalmente impotente para impedir ou revogar os atos da Comissão Europeia (que é o corpo executivo da União Europeia). Os membros da comissão não são eleitos, mas sim designados pelos governos dos estados-membros.
Sendo um conglomerado formado por dezenas de comissões anônimas e secretas, a UE é um paraíso para um burocrata. Pessoas extremamente poderosas permanecem praticamente anônimas, seguras para impingir seus infindáveis esquemas intervencionistas sem jamais temer qualquer punição dos eleitores. Praticamente ninguém é capaz de citar os nomes dos mais poderosos indivíduos da UE, seja
dos cinco presidentes da UE ou de outros poderosos membros das organizações pertencentes à UE.
Como bem disse um observador: "De que adiantaria eu saber quem eles são? Ninguém tem nenhum poder sobre eles."
Agora, compare isso ao sistema suíço, que é fortemente localizado, descentralizado, dependente de referendos feitos localmente, e sujeito a vetos dos eleitores. A desconfiança do poder centralizado é algo fortemente arraigado nos suíços. Já o sistema da União Europeia, por outro lado, é a própria encarnação da centralização burocrática.
O Reino Unido faria bem em sair da UE e ser mais como a Suíça.
Contas a pagar
Uma saída do Reino Unido da União Europeia seria totalmente diferente de, por exemplo, uma saída da Grécia. Embora a Grécia faça parte da zona do euro e o Reino Unido não, a Grécia é uma recebedora líquida das transferências da UE, ao passo que o Reino Unido é um pagador líquido.
Não é difícil entender por que alguns britânicos podem se cansar de pagar as contas dos governos de Portugal, Espanha e Grécia quando a própria Grã-Bretanha tem vários desafios econômicos para resolver.
O equilíbrio do poder na União Europeia seria dramaticamente alterado. Com a saída do Reino Unido, a base econômica produtiva da UE — os "estados pagadores líquidos", como a Alemanha — seria ainda mais pressionada. Alemanha e França teriam agora, majoritariamente, de arcar com o financiamento da UE. Consequentemente, a saída do Reino Unido faria com que o equilíbrio do poder fosse deslocado ainda mais em prol dos mais numerosos estados recebedores de repasses.
Poderia isso acelerar a
saída da Alemanha da UE? Possivelmente, embora seja difícil prever por quanto tempo os europeus conseguirão continuar invocando o sentimento de culpa do nazismo para continuar chantageando emocionalmente a Alemanha a subsidiar o resto da Europa.
Imigrantes
No entanto, a questão dos imigrantes muçulmanos continua sendo o tópico principal.
Com a recente enxurrada de refugiados e imigrantes entrando na Europa, a pressão dos cidadãos britânicos sobre o governo aumentou. Os burocratas de UE propuseram espalhar os imigrantes por vários países da Europa de acordo com um plano de re-assentamento pré-definido. Naturalmente, os britânicos não gostaram da ideia, pois, além das questões que envolvem a segurança nacional, os novos imigrantes gerarão uma pressão adicional sobre o estado assistencialista britânico.
E, mesmo que absolutamente nenhum imigrante fosse realocado para o Reino Unido, os britânicos ainda assim teriam de financiar ao menos parcialmente o re-assentamento dos imigrantes no resto da Europa por meio dos impostos que pagam para sustentar a União Europeia.
Uma solução parcial para tudo isso seria, novamente, apenas sair da União Europeia. Com a saída do país da UE, o Reino Unido teria agora mais soberania sobre suas fronteiras e não seria obrigado a direcionar dinheiro de impostos para sustentar imigrantes em outros países.
Por tudo isso, as perspectivas de que o referendo opte pelo 'sim' são consideráveis. Seria interessante.