segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Carlos Lacerda contra o comunismo ( CARLOS AZAMBUJA)

CL
"...pois já são muitos os subjugados pelo medo, o medo de parecer reacionário e o medo de lutar contra o inevitável. O medo de se opor e o medo de não se opor. O comunismo é que é reacionário. E não é inevitável."

"O domínio pela coação psicológica e intelectual prepara monstros de conformismo, como os aleijões intelectuais que, mal saídos de uma universidade católica, vão dirigir a União Nacional dos Estudantes, ramo brasileiro da União Internacional com sede em Praga, ninho de filhotes de quinta-coluna; e de lá saem, pela mão do presidente em exercício da República, para dirigir a Reforma Agrária, em cujo nome tantos crimes se cometem – crimes contra a Constituição, contra a produção, contra a educação."

O comunismo é um sistema de poder totalitário no qual uma casta burocrática e privilegiada, reunindo pela primeira vez no mundo moderno todos os instrumentos do poder nas mesmas mãos, possui ao mesmo tempo os meios de produção e de troca e todos os meios de enquadramento político e cultural, dos quais se serve ditatorialmente.
Eis uma síntese para recordar o que o maior brasileiro de seu tempo, Carlos Frederico Werneck de Lacerda, escreveu no prefácio do livro "Em cima da Hora”, de Suzanne Labin, editado no Brasil em 1964, traduzido por Lacerda antes de março de 64.
 
No prefácio, Carlos Lacerda escreveu que o livro “Em Cima da Hora” é uma importante contribuição à luta pela democracia no Brasil, pois são impressionantes a ignorância e a candura com que se faz o jogo dos soviéticos, na infiltração, na propaganda e na conquista deste país, decisivo para a América Latina e para o próprio destino da liberdade no mundo.
ecdh"Os liberais arrependidos, os socialistas retardados, os religiosos tomados de surpresa, os ensaístas deslumbrados, os jornalistas alfabetizados, os intelectuais ressentidos, os desajustados da liberdade, os novos-ricos de certos bancos e os novos-pobres de certo espírito, formam as mais estranhas combinações para abrir caminho à propaganda, ao sofisma, às idéias-força da Guerra Subversiva que os soviéticos movem contra o mundo livre."
"Sem defesa adequada, com os partidos em dissolução, as Forças Armadas intrigadas e perplexas, a própria Igreja Católica ameaçada de divisão e de se colocar, em vários setores, a serviço da subversão pensando que assim se renova, o que mais admira é como o Povo, o simples e bom Povo do Brasil ainda não se convenceu, de vez, que o regime soviético é o melhor. Pois, de todos os lados, os responsáveis pela sua formação cultural, espiritual, econômica, e pela sua defesa militar, ou tentam convencê-lo a se entregar ou se omitem, com o pavor de não serem admitidos no paraíso soviético que pretende abrir aqui uma sucursal."
"Um Presidente da República tem o desplante de dizer que a Constituição que jurou defender e nunca respeitou nem cumpriu, está superada. E contra ela mobiliza, numa aliança natural, os negocistas e os comunistas, igualmente interessados em saquear o Brasil, privando-o da ordem democrática, da ordem com liberdade, da liberdade com responsabilidade."
"Há os que dizem: é inútil combater o comunismo, o que há a fazer é combater a miséria. Supondo que a miséria acabe no mundo antes do comunismo, tomemos o argumento: o comunismo só vence onde há miséria. Logo, ele precisa da miséria para vencer. Portanto, cada vez que se aceita a colaboração dos comunistas e seus auxiliares na alegada luta contra a miséria, está-se trazendo um balde de gasolina para apagar o incêndio."
"Outro argumento apresentado com freqüência é o da “coexistência pacífica”. Supor que a ditadura soviética se deixará confinar nos territórios já ocupados, e uma nova linha de Tordesilhas dividirá o mundo entre zonas de influência dos Estados Unidos e da Rússia, que se respeitarão entre si, é uma versão nova do espírito de Munique."
"Com deplorável leviandade, fruto da aflição servida pela ignorância, certos prelados confundem economia social com assistência social, e Jesus Cristo com Jean Jacques Rousseau. Uma epidemia de oportunismo, agravada pela ignorância e pelo pedantismo se apossa do Brasil. Este é bem o momento de fazer ouvir a voz clara e sincera de uma inteligência poderosa, leal à missão que se impôs."
"Certo, há que lutar pelo bem-estar social. Mas, a condição de êxito dessa luta é a eliminação do comunismo. Não é só a miséria a estimular o comunismo. É o comunismo a estimular a miséria."
"Poucos fatores podem ser tão decisivos, na guerra política, quanto um livro. Foi com livros que Lênin deu saída à Revolução Russa. É com livros, é com idéias que podemos fazer a Revolução Brasileira."
"Quem quiser entender o que se está passando no Brasil, e contribuir para mudar esses acontecimentos terríveis, deve ler este livro. Os inimigos também. Ele só não adianta aos tolos."





















sexta-feira, 27 de novembro de 2015

As quatro causas da desigualdade brasileira (Leandro Narloch)

desigualdade-capa.jpgQue o Brasil é um dos países com maior desigualdade social todo mundo já sabe. Passamos a juventude ouvindo isso do professor de geografia ou durante a propaganda eleitoral na TV. O que se discute um pouco menos é por que o país é assim. Qual a origem de tanta concentração de renda no Brasil?
A resposta a essa pergunta costuma vir em tom moralizante. Culpamos a nós mesmos — a nossa história, a nossa sociedade — por irmos tão mal no ranking da igualdade. "A opressão das elites patriarcais", "a manutenção de terríveis arcaísmos", "os baixos salários pagos pelas grandes empresas" são explicações que atribuem a algum inimigo imaginário — geralmente os ricos — a culpa pela má situação dos pobres.
Na verdade, as origens da desigualdade de renda no Brasil estão muito longe das "crueldades" do capitalismo ou das maldades de uma classe social. Nem todos os motores de concentração de renda no Brasil são evitáveis — dois deles (os dois primeiros, abaixo) são até mesmo motivo de orgulho para os brasileiros.
1. O Brasil é desigual porque é livre
Se você perguntar a um sociólogo ou economista da Unicamp quais são as causas da desigualdade no Brasil, ele vai despejar automaticamente frases sobre a "a ação do livre mercado" e "a exclusão causada pelo capital".  Essa visão, na verdade . . . está correta.
É claro que o capitalismo e o mercado causam desigualdade. O que os economistas chamam de mercado nada mais é do que a reunião de pessoas interessadas em trocar bens entre si. E as pessoas têm interesses, preferências e necessidades diferentes. Essa diversidade de preferências faz a renda se concentrar.
Isso fica claro num exercício de imaginação. Suponha que, de repente, todo o dinheiro do Brasil seja dividido igualmente entre todos os brasileiros. De um dia para o outro, nos tornamos um país mais igualitário que a Noruega; o coeficiente de Gini cai a zero.[1] O banqueiro Joseph Safra e o cobrador de ônibus acordam com o mesmo patrimônio.
Agora imagine que, no dia seguinte a essa revolução igualitária, surge na internet um canal de humor chamadoPorta dos Fundos. Os humoristas do Porta dos Fundos escrevem roteiros geniais; os vídeos que eles lançam logo geram comentários e milhões de visualizações. Ao clicar tantas vezes em links do Porta dos Fundos, os brasileiros dão mais dinheiro a esse grupo de humoristas que a outros, criando a desigualdade no mercado de humor pela internet. O Porta dos Fundos ficaria com a maior parte da verba destinada a canais de comédia do YouTube, sem falar nos anunciantes que, por vontade própria, decidirão usar sua parte da renda dividida igualmente entre os brasileiros para contratá-los como garotos-propaganda.
A situação inicial, em que todos os brasileiros tinham a mesma renda, terá desaparecido.
Os humoristas do Porta dos Fundos não oprimiram ninguém ao aumentar a desigualdade no país. Pelo contrário, eles tornaram a vida mais divertida e foram remunerados justamente por seu talento. Deveriam os brasileiros, para preservar a igualdade nacional, serem proibidos de assistir a tantos vídeos do Porta dos Fundos e obrigados a assistir a alguns de A Praça é Nossa? Não, os brasileiros são livres para assistir ao que quiserem, e essa liberdade concentra a renda.
Do mesmo modo, o mais comunista dos fãs de Música Popular Brasileira está disposto a pagar um bom punhado de reais para assistir a um show do Chico Buarque. Mas não iria ao show "Leandro Narloch canta os grandes sucessos de Kelly Key" nem que lhe pagassem dez reais para isso. Ao escolher pagar a uns artistas mais que a outros, o mais comunista dos apreciadores de MPB está aumentando a desigualdade no mercado da música. Deveríamos proibi-lo de tomar essa decisão?
Deveria o governo obrigar o rapaz a pagar por um show do Chico Buarque o mesmo que pagaria a mim tentando cantar "Baba, baby, baba"? Eu até gostaria, mas isso seria injusto. As pessoas são livres para tomar decisões que aumentam a desigualdade — mesmo as decisões mais absurdas e disparatadas, como pagar caro para assistir a um show do Chico Buarque.
Nesses exemplos acima, eu peguei emprestado o "argumento Wilt Chamberlain" que o filósofo Robert Nozick formulou no livro Anarquia, Estado e Utopia, de 1974. O caso é o similar: imagine que todo o dinheiro do país é dividido igualmente entre os cidadãos, e imagine que o jogador de basquete Wilt Chamberlain assina um contrato para jogar numa partida cobrando mais que os outros jogadores. Como Wilt Chamberlain é um gênio do basquete, muitas pessoas exerceriam seu livre direito de escolha e aceitariam pagar mais para assisti-lo ao vivo. A situação inicial, de igualdade total entre os cidadãos, não seria estável numa sociedade livre, pois, como Nozick arrematou, liberty upsets patterns. A liberdade perturba padrões.
A livre-iniciativa torna o Brasil e todos os países do mundo desiguais, mas ela não é suficiente para explicar por que somos campeões mundiais nessa modalidade. A concentração de renda tem causas além das forças do mercado.
2. O Brasil é desigual porque é diverso
A história do livro A Jangada de Pedra gira em torno de um episódio descomunal: o território de Portugal e Espanha se separa do resto da Europa e passa a vagar pelo oceano Atlântico. "A Península Ibérica se afastou de repente, toda por inteiro e por igual (...) abriram-se os Pireneus de cima a baixo como se um machado invisível tivesse descido das alturas", conta José Saramago.
É interessante imaginar uma continuação desse estranho fenômeno. Digamos que a Península Ibérica, pairando sobre o Atlântico, comece a atrair o território de outros países. A Dinamarca é o primeiro. A ponte que liga Copenhague à Suécia de repente se rompe; o território dinamarquês se desprende também do norte da Alemanha, atravessa o mar do Norte e encontra portugueses e espanhóis no Atlântico. Na costa oriental da África, Quênia e Tanzânia têm o mesmo destino. Os dois países se desprendem da África, contornam o cabo da Boa Esperança, sobem o Atlântico e se fundem aos três outros separatistas. Teríamos assim um novo país, que agruparia no mesmo território mais de 150 milhões de habitantes da Dinamarca, Espanha, Portugal, Quênia e Tanzânia.
Se os dinamarqueses, sempre atentos à concentração de renda, começassem a medi-la nesse novo país, constatariam estar vivendo numa sociedade muito mais desigual. Não apenas teriam, entre seus conterrâneos, quenianos e tanzanianos, alguns dos cidadãos mais pobres do mundo, como também 400 mil novos milionários espanhóis e portugueses, bem mais endinheirados que o dinamarquês médio. A taxa de desigualdade iria às alturas, ainda que fosse meio injusto lamentar esse efeito estatístico, pois sociedades obviamente diferentes haviam sido agrupadas de supetão no mesmo território. No meio desse novo país, um grupo só dos dinamarqueses continuaria tão igualitário quanto antes. E as cidades que concentrassem todos os tipos de moradores seriam as mais desiguais.
Um fenômeno como esse — não o movimento acelerado de placas tectônicas, mas a mistura de povos diversos num grande país — explica boa parte da desigualdade de renda do Brasil. Uma causa importante da desigualdade brasileira é uma das qualidades que nos dá orgulho: a mistura de povos e culturas.
O fato de tribos indígenas e imigrantes suíços donos do Burger King conviverem dentro das mesmas linhas imaginárias empurra a estatística para cima.
Se eu estiver certo, preciso provar que há uma Dinamarca incrustada no território brasileiro. Pois ela existe, fica no Rio Grande do Sul. Das quinze cidades mais igualitárias do Brasil, doze são gaúchas de origem alemã.
AS CIDADES MAIS IGUALITÁRIAS DO BRASIL
1. São José do Hortêncio (RS) 0,28
2. Botuverá (SC) 0,28
3. Alto Feliz (RS) 0,29
4. São Vendelino (RS) 0,29
5. Vale Real (RS) 0,29
6. Santa Maria do Herval (RS) 0,30
7. Tupandi (RS) 0,31
8. Campestre da Serra (RS) 0,31
9. Nova Pádua (RS) 0,32
10. Córrego Fundo (MG) 0,32
11. Santa Rosa de Lima (SC) 0,32
12. Picada Café (RS) 0,32
13. Presidente Lucena (RS) 0,32
14. Vila Flores (RS) 0,32
15. Morro Reuter (RS) 0,32
A cidade com a renda mais distribuída do país, São José do Hortêncio, tem um índice de Gini de 0,28, abaixo dos 0,29 da Dinamarca. Não houve nessas cidades nenhuma política pública de redução de desigualdade, nenhum imposto sobre fortunas ou coisa parecida. O que explica a igualdade por lá é simplesmente a semelhança entre os cidadãos. A semelhança entre os moradores explica a igualdade escandinava. Assim como os dinamarqueses, quase todos ali têm a mesma origem cultural, o mesmo nível de educação. E muitos têm origem luterana, como os dinamarqueses, o que historicamente contribuiu para a igualdade.
"Comunidades protestantes trabalharam para difundir educação que garantiria que todos pudessem ler a Bíblia, o que tanto aumentou o nível de educação quanto diminuiu sua variação", diz o economista Edward Glaeser.
Portanto, se você procura igualdade, pense em locais onde a população é homogênea: cidades habitadas somente por sertanejos pobres ou somente por descendentes de alemães. Pessoas com a mesma origem e cultura. Caatiba, na Bahia, é tão igualitária quanto Portugal ou o Japão (Gini 0,39), pois Caatiba reúne só um tipo de moradores – famílias pobres de pequenos criadores de gado.
Em contrapartida, para achar os locais com maior desigualdade de renda, é preciso mirar nas cidades em que grupos bem diferentes moram juntos. É o caso das capitais, que atraem tanto o João Paulo Diniz, herdeiro da rede de supermercados Pão de Açúcar, quanto o ex-boia-fria que sonha em ganhar mil reais por mês como jardineiro do João Paulo Diniz.
Mesmo Florianópolis e Curitiba, as duas capitais mais igualitárias do Brasil, estão acima da média nacional de desigualdade.
No entanto, por causa da classe média expressiva, as capitais não são as campeãs nesse quesito. As cidades mais desiguais são aquelas que reúnem um pedaço da Dinamarca, outro do Quênia e só. É o caso de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, a cidade brasileira mais desigual. Com um índice de Gini de 0,80, ela supera de longe Seychelles, o país com renda mais concentrada no mundo (0,65).
O motivo? Em São Gabriel da Cachoeira há apenas dois tipos de moradores: mais de 400 tribos indígenas, que formam 74% da população e não têm renda formal, e militares, médicos e outros agentes federais muito bem pagos. De fronteira com a Venezuela e a Colômbia, São Gabriel da Cachoeira é sede de batalhões e órgãos federais de vigilância. A cidade prova, como nenhuma outra, o impacto da diversidade cultural sobre a desigualdade econômica.
"Em países particularmente igualitários, como os da Escandinávia, a população é geralmente bem-educada e a distribuição de qualificação bem compacta", afirma o economista Edward Glaeser. "Já países particularmente desiguais e em desenvolvimento, como o Brasil, são enormemente heterogêneos nos níveis de qualificação entre elites urbanas bem-educadas e trabalhadores do campo pouco educados."
Talvez a miscigenação atue ainda de outra maneira. Provavelmente por vantagens evolutivas da lealdade de grupo, as pessoas tendem a contribuir mais com quem se parece com elas ou pertence à mesma identidade coletiva. Palmeirenses ficam mais contrariados com o dinheiro público gasto no Itaquerão que os corintianos.
O economista Erzo Luttmer mostrou, em 2001, que, nos Estados Unidos, o valor dos programas de redistribuição de renda é menor nos estados onde a população é mais diversa. "Se indivíduos preferem contribuir para sua própria raça, etnia ou grupo religioso, eles optam por menos redistribuição quando membros de seu grupo constituem uma parte menor dos beneficiários", diz Luttmer. "Com o aumento da diversidade, a porção de beneficiários que pertencem a um grupo diminui em média. Então o apoio médio para redistribuição cai se a diversidade aumenta." 
Isso leva a uma conclusão impressionante. Não foi o estado de bem-estar social que possibilitou a igualdade da Dinamarca, mas o contrário: a semelhança entre os cidadãos escandinavos possibilitou o estado de bem-estar social.
Quem quer um Brasil com um índice escandinavo de igualdade precisa torcer para que algum fenômeno a la Saramago divida o país em diversos territórios. Uma alternativa é deixar de ligar tanto para a estatística de desigualdade — e desfrutar a diversidade e a miscigenação que definem o Brasil.
3. O Brasil é desigual porque as famílias pobres tinham muito mais filhos que as ricas
Um motor importante (e pouco lembrado) da desigualdade e da miséria no Brasil é a demografia.
O fato de, por um longo período, mulheres pobres terem tido mais filhos que mulheres ricas elevou a estatística da desigualdade. Nos anos 1970, a diferença era enorme: cada mulher pouco escolarizada tinha, em média, 4,5 filhos a mais que as escolarizadas. Em 2005, o motor tem uma potência menor (diferença de 1,6), mas continua ligado.
"Os pobres não apenas têm menores salários que os ricos, mas também dividem esse salário entre mais indivíduos, resultando em maior desigualdade de renda per capita", dizem os economistas Ricardo Hausmann e Miguel Székely em um estudo sobre fecundidade e desigualdade na América Latina.
Trata-se de simples aritmética. A renda per capita, como diz o nome, é calculada pelo número de cabeças. Um casal que ganha 1.400 reais e tem três filhos resulta numa renda per capita de 280 reais. Se o mesmo casal tivesse cinco filhos, a renda per capita cairia para 200 reais.
Isso, é claro, se o casal continuar ganhando 1.400 reais. Infelizmente, há muitas chances de a renda diminuir com o aumento da família. Filhos exigem tempo — tempo que os pais poderiam gastar trabalhando. Mais filhos significam menos chances (sobretudo entre as mães) para trabalhar e ganhar dinheiro. Esse efeito é maior em mulheres com salário baixo, que têm menor custo de oportunidade (ou seja, perdem pouco se decidirem largar o trabalho para ficar em casa cuidando das crianças).
Além disso, mais filhos significam mais gastos — e menos dinheiro para investir na educação de cada um. "O número de filhos que um casal decide ter possui forte relação com o nível de educação que os pais conseguirão fornecer aos filhos", dizem Hausmann e Szekely. Cada criança começará a vida com uma parte menor da renda dos pais e com menor escolaridade. Um estudo de 2014 mostra que até 40% da queda da desigualdade de renda são explicados pela queda na desigualdade de escolaridade.
Fica ainda pior. Crianças com pouca escolaridade, quando crescerem, vão concorrer no mercado por vagas de pouca qualificação, aumentando a oferta de trabalhadores não qualificados.  Uma vez que salários, assim como qualquer preço, são definidos pela oferta e procura, o salário de pessoas não qualificadas vai cair, aumentando a diferença de renda entre pouco e muito qualificadas. O maior número de filhos ainda resulta em uma poupança menor — e um país com menos economias tem menos capacidade de investimento.
Por outro lado, se você tem menos filhos, pode investir mais na educação de cada um deles, quem sabe pagar um intercâmbio para a Inglaterra quando o rapaz chegar à adolescência. Se menos jovens bem qualificados aparecem no mercado, cai a oferta de empregados para vagas mais qualificadas; devido à oferta e à procura, o salário nessas áreas sobe. Em 1973, o economista Carlos Langoni mostrou que, se a economia cresce muito rápido, a baixa educação dos cidadãos se torna um motor potente de desigualdade. Com muitas empresas à procura de funcionários, os poucos candidatos qualificados viram uma mercadoria tão escassa quanto casa de praia durante a temporada. O salário deles sobe muito mais que o dos menos educados, aumentando a desigualdade.
Resumindo: pobres, em geral, dividem a renda com mais indivíduos e educam menos os filhos, contribuindo para oferta maior (e menores salários) de trabalhadores pouco qualificados; ricos dividem a renda com menos filhos e conseguem dar uma melhor educação a eles, contribuindo para não aumentar a oferta (e garantindo maiores salários) de pessoas bem qualificadas.
O poder dessa máquina de desigualdade já foi calculado. Em 2010, 45,2% dos brasileiros eram donos de apenas 10% da renda do país, enquanto 5,9% dos brasileiros ficavam com 40% da renda.
Como seriam esses números se a fecundidade de 1980 tivesse permanecido estável até 2010? Teríamos mais pobres dividindo os mesmos 10% e menos ricos desfrutando os 40% da renda nacional. "Se a natalidade não tivesse caído, as proporções comparáveis seriam de 62% e 4,1%, respectivamente", diz a pesquisadora Ana Amélia Camarano, do Ipea.
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O demógrafo Jerônimo Muniz, da UFMG, tem estudos similares. Ele calculou o que aconteceria com a desigualdade social no Brasil entre 1990 e 2000 se todas as variáveis, com exceção da demografia, ficassem constantes. Em 1990, a diferença de fecundidade entre mulheres pobres e ricas era bem menor que nas décadas anteriores, mas ainda existia. "Se a demografia fosse o único componente do cálculo, a proporção de pobres aumentaria 28% entre 1990 e 2000. Isso corresponderia a 42% da população. Já a desigualdade seria até 40% maior", diz Muniz.
Por causa da estabilidade da moeda e o crescimento (ainda que pequeno) da economia, houve um movimento modesto na direção contrária: a pobreza caiu 9% entre 1990 e 2000.
Estaria eu culpando a vítima ao dizer que as mulheres de classe baixa são responsáveis pela alta desigualdade do Brasil? Nunca me esqueço de uma vizinha da minha mãe que pagava menos de um salário mínimo para a empregada e não se cansava de dizer que os pobres eram pobres porque nada faziam além de ter filhos. Não: culpa não é um conceito que funciona bem em economia. Os pobres provavelmente ficaram presos numa armadilha: sem dinheiro e informação, tiveram muitos filhos, o que os deixou com ainda menos dinheiro e informação.
Não é correto culpar os pobres nem os ricos pela desigualdade. Basta entender que é a demografia, e não tanto a opressão das grandes empresas e do capitalismo, que explica boa parte da concentração de renda no Brasil.[2]
4. O Brasil é desigual porque o estado esculhamba o país
Uma opinião comum nas discussões sobre economia é que, se o governo deixar, as grandes corporações vão avançar sobre os pequenos empresários e os ricos concentrarão toda a renda do país.
Não, é o contrário.
Grandes empresas recorrem a políticos para se tornarem monopólios. Empresários já estabelecidos em um negóciopressionam o governo para aumentar regras e exigências, dificultando a vida de possíveis concorrentes. Leis urbanísticas protegem o patrimônio dos ricos contra a desvalorização. E os brasileiros de classe A são quem mais recebe dinheiro público.
Quem diz isso é um cara de esquerda, o economista Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de 2001. No livro O Preço da Desigualdade, Stiglitz dedica todo um capítulo sobre ações do governo que deixam os pobres mais pobres e os ricos mais ricos. Seu principal alvo é o rent-seeking — a arte de conseguir benefícios e privilégios não pelo mercado, mas pela política.
livro1.jpg"O rent-seeking tem várias formas: transferências ocultas ou abertas de subsídios do governo, leis que tornam o mercado menos competitivo, leniência com as leis de proteção da competição, e regras que permitem às corporações tirar vantagem dos outros ou transferir custos para a sociedade".
Stiglitz diz que a América Latina é rica em privilégio a grandes empresas — e ele está certíssimo. Dos casos recentes da política brasileira, o exemplo mais bem-acabado é o da Braskem, a maior petroquímica brasileira. A Braskem é a única fabricante nacional de diversas resinas plásticas usadas na fabricação de brinquedos, embalagens, cadeiras de plástico, carpetes, seringas, peças de carros e eletrodomésticos, tubos, canos — enfim, de quase tudo. Na média mundial, o imposto de importação de resinas é de 7%. No Brasil, era de 14%, mas em 2012 a presidente Dilma elevou a taxa para 20%.
Na época, o aumento causou revolta, pois reverberaria em toda a cadeia de produtos plásticos made in Brazil. "A iniciativa beneficiará somente um monopólio instalado no país, o da Braskem, prejudicando toda uma cadeia produtiva e, o que é mais grave, os consumidores pagarão a conta", escreveu José Ricardo Roriz Coelho, então presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico. 
Com os concorrentes estrangeiros fora do páreo, a Braskem pôde cobrar mais pelas resinas que vendia a 12 mil fábricas brasileiras. Entre janeiro de 2013 e fevereiro de 2014, o aumento dos produtos da empresa foi de 27,6%. Agora, adivinha quem controla a Braskem? Nada menos que a Odebrecht, empresa envolvida até a alma em escândalos de corrupção e propinas para o partido no poder.
Durante a operação Lava Jato, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Yousseff disseram que a Braskem pagava propina em troca maiores lucros em contratos com a Petrobras.
Outros motores estatais de desigualdade não são tão fáceis de perceber. As leis urbanísticas, por exemplo. Em muitas cidades brasileiras, a prefeitura impõe um limite de área construída em relação à área do terreno. É por isso que o Brasil não tem prédios com mais de cem andares, como em qualquer lugar civilizado. A regulação urbanística cria uma escassez artificial de espaço urbano, empurrando o preço para cima.
Esse fenômeno não é exclusividade do Brasil. Leis que dificultam a construção de prédios aumentam o preço dos imóveis em 800% na cidade de Londres e em 300% nas metrópoles Paris e Milão.
A principal tese do francês Thomas Piketty, autor de O Capital no Século 21, é que o retorno sobre o capital vem crescendo em relação ao retorno sobre o trabalho. Está valendo mais a pena viver de renda que do trabalho. Por que isso acontece? Para o norte-americano Matthew Rognlie, estudante de economia de 26 anos que virou o anti-Piketty, as leis de zoneamento são um dos motivos. "Quem está preocupado com a distribuição de renda precisa ficar atento aos custos de moradia", escreveu ele. Com a escassez artificial de espaço, quem tem imóveis fica ainda mais rico, enquanto os que estão lutando para comprar um imóvel precisam contrair uma dívida maior para realizar o sonho da casa própria. O de cima sobe e o de baixo desce, como dizia aquele axé da banda As Meninas.
Há ainda a inflação. Quando as notas de real se desvalorizam, ricos correm para aplicações bancárias atreladas ao reajuste dos preços. Quanto mais dinheiro, melhor a proteção, já que investimentos de grande volume costumam ser remunerados com taxas melhores. Já os pobres não conseguem se proteger tão bem. Alguns não se protegem nada: 55 milhões de brasileiros nem sequer têm uma simples caderneta de poupança. Quando o governo descuida da estabilidade da moeda, atinge em cheio os mais pobres.
O leitor já deve estar assustado com o poder do governo de concentrar a renda — e olha que ainda nem chegamos ao principal motor de desigualdade do Brasil. É este aqui: a aposentadoria integral de funcionários públicos e as pensões especiais. Um estudo recente e enfático sobre isso é "Gasto Público, Tributos e Desigualdade de Renda no Brasil", de Marcelo Medeiros e Pedro Souza, pesquisadores do Ipea [comentado aqui]. Eles analisaram todas as movimentações financeiras do governo brasileiro e calcularam o impacto de cada tipo de transação no coeficiente de Gini brasileiro. A conclusão é de assustar:
Cerca de um terço da desigualdade total pode ser diretamente relacionado às transferências de renda e aos pagamentos feitos pelo Estado aos indivíduos e às famílias, mesmo depois de considerarmos os efeitos progressivos dos tributos diretos e das contribuições.
Como é possível o estado aumentar a desigualdade se toda hora vemos na TV o Bolsa Família e outras ações públicas de assistência aos pobres? A resposta é que, ao mesmo tempo em que propagandeia a transferência de dinheiro para os pobres, o governo brasileiro mantém Bolsas Famílias ao contrário: programas que tiram dos pobres para dar aos ricos e ao governo.
A famosa foto da desigualdade social esconde uma excelente notícia
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Não há livro didático ou reportagem sobre concentração de renda que não exiba a foto da favela de Paraisópolis ao lado de um prédio de apartamentos de luxo no Morumbi, em São Paulo. A foto ilustra, como nenhuma outra, o fato de tantos terem tão pouco e tão poucos terem tanto. Mas esconde, na verdade, uma excelente notícia.
Quando jornalistas ou autores de provas do ENEM escolhem a foto de Paraisópolis para retratar a desigualdade social, costumar comparar a riqueza dos apartamentos com a miséria da favela. No entanto, a comparação mais adequada é a dos moradores da favela hoje e no passado, antes de se mudarem para a metrópole. Não foram os moradores dos apartamentos do Morumbi que criaram a miséria de Paraisópolis — pelo contrário, eles ajudaram a diminuí-la, e muitos deles próprios são netos ou bisnetos de gente miserável.
"A pobreza urbana não deveria ser comparada à riqueza urbana", diz o economista Edward Glaeser, professor de Harvard e o mais celebrado especialista em economia das cidades. "As favelas do Rio de Janeiro parecem terríveis se comparadas a bairros prósperos de Chicago, mas os índices de pobreza no Rio são bem menores que no interior do Nordeste brasileiro."
Quem mora em Paraisópolis vive muito melhor do que se houvesse permanecido no sertão nordestino, nas lavouras de boias-frias do Paraná ou entre os escombros do Haiti. Não importa se a miséria está mais aparente ou mais próxima; o principal é que, para os miseráveis, ela tenha diminuído.
Como arremata o economista Glaeser: "A pobreza urbana não deveria envergonhar as cidades. As cidades não criam pobres. Elas atraem pobres. Elas atraem pobres justamente porque fornecem o que eles mais precisam — oportunidade econômica."
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Capitalismo de Estado na Banânia. Ou:"André Esteves é 13" (oantagonista)

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Preso ontem pela Polícia Federal, o banqueiro André Esteves, de apenas 46 anos, é o 13º bilionário do País, com uma fortuna próxima a R$ 9 bilhões - a maior parte amealhada na gestão petista.
Se a PF e o MPF - e, claro, o Banco Central - quiserem mergulhar nas operações do BTG, vão descobrir que a instituição financeira fundada por Esteves tem sido administrada à sua imagem e semelhança. Convidado a patrocinar o plano espúrio de Delcídio Amaral, Esteves carrega um histórico de ações de socorro a amigos do PT -- socorro não gratuito, é claro,
Foi assim com a Estre Ambiental, que quase quebrou meses depois de doar R$ 5 milhões para o Diretório Nacional do PT.
Foi assim com a WTorre, que não teve fôlego para concluir as obras do complexo empresarial que hoje serve de sede à Petrobras.
Foi assim com a própria Petrobras, quando precisou se desfazer dos ativos na África para reduzir o rombo financeiro deixado pela administração de José Sérgio Gabrielli.
Foi assim com a agenciadora de sondas do pré-sal Sete Brasil, uma invenção petista para garantir fonte segura e inesgotável de pixulecos para o partido.
Foi assim ao aportar milhões no grupo STR, que teve o filho de Aloizio Mercadante como um dos sócios.
Os exemplos não cabem neste post.









quinta-feira, 26 de novembro de 2015

A História do Thanksgiving Day nos EUA. Ou: A Insensatez Coletivista (João Luiz Mauad)

“A relação entre cada homem e os frutos do seu trabalho é muito forte … “seu” e “meu” são expressões comuns em todas as línguas, familiares entre os selvagens e entendidas mesmo pelas crianças”. John Maynard Keynes
pilgrimOs americanos comemoram nesta quinta-feira o Dia de Ação de Graças (Thanksgiving Day).  Este é um dos feriados mais importantes do calendário deles, quando as pessoas, independentemente de religião, se reúnem para agradecer a fartura e a prosperidade.  O Thanksgiving é uma tradição inglesa antiga que, nos Estados Unidos, teve início por volta de 1623 e faz parte de uma história tão interessante quanto educativa.
Uma das primeiras colônias a instalar-se na América do Norte foi a Plymouth Colony, estabelecida onde hoje é o estado de Massachussets, nos anos de 1620.  Numa experiência inédita até então, um contrato coletivo, assinado pelos imigrantes antes mesmo de sua chegada ao Novo Mundo, estabelecia um sistema no qual as propriedades seriam todas comuns.  Além disso, toda a produção deveria ser entregue para armazenamento comunitário, do qual cada indivíduo receberia uma fração igual, não importando com quanto contribuísse.
Como ensinara Aristóteles 2000 anos antes, “aquilo que é comum ao maior número despertará sobre si os menores cuidados”.  Na esteira da grande sabedoria do Estagirita e de acordo com a moderna teoria dos incentivos, os bons economistas ensinam que, quando as pessoas obtêm o mesmo retorno, não importa o esforço que precisem fazer, a maioria optará pelo empenho mínimo.  Não por acaso, portanto, a produção em Plymouth era insuficiente até mesmo para as necessidades da própria gente.  Faltava comida, embora sobrasse ócio e acomodação.
A insensatez coletivista levou rapidamente a economia da colônia à penúria.  Em 1623, apenas dois anos após a chegada dos primeiros Pilgrims, a fome já era desesperadora.  William Bradford, que viria a ser governador da província algumas vezes, assim descreveu aquele triste momento da história americana em seu famoso diário:
“Aquela experiência durou alguns anos … e bem evidencia a vilania deste conceito de Platão e outros patriarcas antigos, aplaudido por muitos ultimamente, segundo o qual se acabarmos com a propriedade, em prol da riqueza comum, isto fará a comunidade feliz e próspera… Para esta nossa comunidade (até onde aquilo poderia ser chamado de comunidade) o experimento causou muita confusão e descontentamento.  Os homens… lamentavam ter que gastar seu tempo e esforços trabalhando  para as mulheres e as crianças de outros homens, sem que obtivessem qualquer recompensa…”
Encurralada pelas terríveis circunstâncias, a liderança dos colonos resolveu abolir a estrutura socialista que engessava qualquer possibilidade de progresso, transferindo para cada família uma parcela das terras, e permitindo o usufruto de tudo quanto seu trabalho produzisse. A eliminação da propriedade comunal em favor da propriedade privada logo mudou o panorama.  Os colonos rapidamente começaram a produzir muito mais do que eles mesmos poderiam consumir.
Não tardou para que o comércio também florescesse e os excedentes da produção fossem trocados com os índios, que lhes entregavam carnes de caça e peles, estas últimas exportadas com largas margens de lucro para a nobreza europeia.“Esta decisão foi um grande sucesso, pois tornou todas as mãos diligentes e industriosas”, escreveria Bradford pouco tempo depois.
Uma das virtudes da propriedade privada é justamente estabelecer a conexão entre esforços e ganhos, custos e benefícios, criando incentivos para que as pessoas produzam conforme as suas necessidades e ambições. Porém, o direito de propriedade é também, e acima de tudo, a melhor arma contra a barbárie, a garantia de que o pão obtido com o suor do próprio rosto não será tomado de ninguém arbitrariamente.

Socialismo ou intervenção militar ( João Cesar de Melo)

intervenção militar
Compreendo o medo de que o Brasil se torne uma Venezuela. O PT sempre tentará nos levar por esse caminho, o que motiva alguns grupos a pedir intervenção militar. O que esses grupos não entendem é que governos militares têm mais semelhanças do que diferenças com os regimes socialistas.
Em primeiro lugar, devemos nos lembrar de que grande parte da esquerda argumenta que o fracasso de todas as experiências socialistas ao longo do último século foi resultado de deturpações do próprio ideal socialista. Dizem isso depois que as tragédias aconteceram. Dizem isso depois de terem apoiado as experiências. O início da revolução bolivariana contou com o apoio de muitas pessoas que hoje se manifestam contra ela.
Devemos nos lembrar também que muitas pessoas, instituições e meios de comunicação que apoiaram a intervenção militar em 1964, no Brasil, se decepcionaram ao ver que os militares que assumiram o poder para interromper os absurdos de João Goulart acabaram promovendo seus próprios absurdos. O fato do regime resultante da intervenção militar ter perseguido, torturado e assassinado muito menos pessoas do que os regimes comunistas de sua época não faz dele um bom regime, não faz dele uma “ditadura do bem”. Todas as intervenções militares da América Latina se apresentaram como restauradoras da democracia, da liberdade e do desenvolvimento, exatamente o mesmo discurso de todas as revoluções socialistas. Todas as intervenções da direita e todas as revoluções da esquerda resultaram em muito mais prejuízos do que benefícios para as suas sociedades.
Em segundo lugar, tanto o socialismo quanto qualquer intervenção militar representam em conceito e em prática o aumento do poder do estado, o que inevitavelmente gera os maiores problemas para os cidadãos, já que toda concentração de poder tende a politizar os assuntos privados, incluindo a economia.
A grave crise econômica brasileira é resultado de basicamente duas coisas: Aumento de gastos públicos e políticas protecionistas; ou simplesmente da ideia de que o estado deve ser o grande propulsor da economia. Não por acaso, essas foram características do regime militar no Brasil. Tanto o regime militar quanto Lula cativaram o apoio da maioria da população celebrando crescimentos econômicos artificiais.
O resultado dos 20 anos do regime militar: Hiperinflação, estagnação econômica e o alto índice de desemprego na década de 1980.
O resultado dos 13 anos de petismo: Aumento da inflação, recessão econômica e a subida do desemprego, todos com tendência de piora.
Bruno Garschagen, em seu excelente livro Pare de Acreditar no Governo, resume muito bem os trágicos resultados do regime militar, que sustentou “uma política em que comandava e administrava os preços a partir de um amplo sistema de concessão de crédito, de incentivos e de subsídios para as empresas privadas, mediante a atuação direta das empresas estatais”. Ou seja: O regime militar e o PT compartilharam o mesmo plano econômico. Ambos os regimes privilegiaram os mais ricos. A maioria das construtoras cooptadas pelos esquemas do PT tiveram suas origens no regime militar. O PT continuou o que o regime militar iniciou.
Aldo Mussacchio e Sergio Lazzarini, no livro Reinventando o Capitalismo de Estado, já citado noutros de meus textos, identificam nada menos do que 168 empresas estatais criadas entre 1964 e 1982.
A política do “empreguismo” que o PT utilizou para sustentar sua rede de militância veio da política do regime militar de utilizar as empresas estatais e as grandes obras de infraestrutura para gerar emprego para a população. “O petróleo é nosso” ecoava mais durante o regime militar do que ecoa hoje. A irresponsabilidade fiscal e monetária foram características do regime militar assim como são do governo petista.
Os militantes socialistas de hoje pregam as mesmas coisas que os líderes socialistas do passado pregavam, o que nos leva a fazer uma simples pergunta: Por que deveríamos acreditar que os atuais socialistas governariam diferente?
Os defensores da intervenção militar no Brasil pregam, hoje, a mesma coisa que os militares pregavam antes de tomarem o poder em 1964, o que também nos leva a perguntar:
Por que deveríamos acreditar que desta vez uma intervenção militar seria boa para o Brasil? A partir do que devemos acreditar que os militares de nosso tempo não seriam tão intervencionistas, tão protecionistas e tão antidemocráticos quanto aqueles que governaram por mais de 20 anos? Por qual razão deveríamos acreditar que uma vez tomado o poder, os militares não cairiam na tentação de usá-lo para cometer os mesmos crimes que outros militares cometeram? Por qual razão deveríamos acreditar que uma intervenção militar não se tornaria um regime tão totalitário quando qualquer regime socialista?
As pessoas que, assim como eu, rejeitam as ideias e os procedimentos socialistas, deveriam entender que foi o regime militar que fortaleceu o discurso da extrema-esquerda brasileira. Foi a truculência do regime militar que transformou criminosos comunistas em heróis nacionais. Foram as restrições à liberdade que possibilitaram que as mais absurdas ideias socialistas se popularizarem logo depois da redemocratização do Brasil. Se não fosse a ditadura militar, uma pessoa como Dilma Rousseff sequer seria conhecida.
Se, ao reler a história, concluímos que o regime militar nos livrou de um provável regime comunista, isso não significa que devemos pedir a mesma solução contra o PT.
Sim, estamos no mesmo caminho da Venezuela, mas ainda estamos distantes de nos tornar uma Venezuela. Ainda contamos com muitas instituições e pessoas independentes. Mais de 90% da população se diz insatisfeita com o atual governo. Mais de 80% têm consciência de que Dilma mentiu para se reeleger. Mais de 60% acha que Dilma deveria ser afastada. Ontem, o STF mandou prender um senador do PT em pleno mandato. O que falta a sociedade brasileira é mobilização. Ir para a rua. Ir para a rua todo dia. Desobedecer o governo. Perder o medo de dizer o que sente. Apoiar as pessoas e os movimentos que tentam heroicamente derrubar esse governo utilizando-se apenas de argumentos.
A Argentina também estava no mesmo caminho da Venezuela. Não está mais. No último domingo elegeu um liberal para a presidência. É assim que se faz.
Se a intenção por trás da derrubada do atual governo é abrir espaço para uma nova mentalidade de administração dos recursos públicos e para revisão do papel do estado na vida das pessoas, então uma intervenção militar não deve ser cogitada. Qualquer slogan pró-intervenção deve ser tão hostilizado quanto qualquer slogan comunista ou nazista.
A persistência não transforma péssimas ideias em boas ideias.

Andre Esteves, Eike Batista , representantes do capitalismo de Estado de Banânia...

O capitalismo de estado tem de ser diariamente combatido (IMB)

delcidio-e-esteves-negociavam-dinheiro-para-evitar-delacao-premiada-de-cervero.jpgQuanto maior e mais poderoso um governo, quanto mais leis e regulamentações ele cria, mais os empresários poderosos e com boas conexões políticas irão se aglomerar em torno dele para obter privilégios.
Quanto maior e mais poderoso um governo, quanto mais leis e regulamentações ele cria, mais brechas ele abre para que empresários poderosos se beneficiem à custa dos concorrentes e da população como um todo.
Tais empresários irão, por meio de favores pessoais ou de propinas, burlar estas leis e regulamentações (com o aval de políticos) ao mesmo tempo em que defenderão a imposição destas leis e regulamentações sobre seus concorrentes.  
Isso, obviamente, não é capitalismo genuíno, mas sim uma variação do mercantilismo. Trata-se de um capitalismo mercantilista, um capitalismo de compadrio, um capitalismo regulado em prol dos regulados e dos reguladores, e contra os consumidores.
Neste sistema econômico, o mercado é artificialmente moldado por uma relação de conluio entre o governo, as grandes empresas e os grandes sindicatos.  Políticos concedem a seus empresários favoritos uma ampla variedade de privilégios que seriam simplesmente inalcançáveis em um genuíno livre mercado. 
Há a criação de privilégios legais, que vão desde restrições de importação, subsídios diretos, tarifas protecionistas, empréstimos subsidiados feitos por bancos estatais, e agências reguladoras criadas com o intuito de cartelizar o mercado e impedir a entrada de concorrentes estrangeiros, até coisas mais paroquiais como a obrigatoriedade do uso de extintores e do kit de primeiros socorros nos automóveis e a obrigatoriedade do uso de canudinhos plastificados (devidamente fornecidos pela empresa lobbista) em bares e restaurantes.  
E há a criação de privilégios ilegais, que vão desde fraudes em licitações e superfaturamento em prol de empreiteiras (cujas obras são pagas com dinheiro público) a coisas mais paroquiais como a concessão de bandeiras de postos de combustíveis para empresários que pagam propina a determinados políticos (bandeiras essas negadas para empresários honestos e menos poderosos).
Em troca, os empresários beneficiados lotam os cofres de políticos e reguladores com amplas doações de campanha e propinas. A criação destes privilégios pode ocorrer ou abertamente, por meio de lobbies e da atuação grupos de interesse, ou na surdina, por meio do suborno direto.
Em ambos os casos, empresários poderosos e grupos de interesse conseguem obter privilégios mediante o uso da coerção estatal.  E isso só é possível porque há um estado grande que a tudo controla e tudo regula.
Um estado grande sempre acaba convertendo-se em um instrumento de redistribuição de riqueza: a riqueza é confiscada dos grupos sociais desorganizados (os pagadores de impostos) e direcionada para os grupos sociais organizados (lobbies, grupos de interesse e grandes empresários com conexões políticas.
A crescente concentração de poder nas mãos do estado faz com que este se converta em um instrumento muito apetitoso para todos aqueles que saibam como manuseá-lo para seu benefício privado.
Os libertários, obviamente, se opõem radicalmente a ambos esses arranjos, tanto o legal quanto o ilegal. 
E a receita que propõem é bem simples: se os lobbies, os grupos de interesse e as propinas surgem porque o estado detém um grande poder regulatório e decisório, então nada mais lógico do que reduzir o estado a uma mínima expressão.
O problema é que esta receita rapidamente gera algumas dúvidas e suspeitas legítimas entre aqueles que estão dispostos a fazer um debate racional (e não um emocional e ideologizado): se por acaso o estado fosse reduzido a uma expressão mínima, os lobbies e grupos de interesse não acabariam tendo muito mais poder do que têm hoje?  Será que não necessitamos de um estado forte justamente para que ele mantenha os grupos de interesse dominados (muito embora a empiria confirme que os lobbies e os grupos de interesse prosperam justamente com estados fortes)? A diminuição do estado não levaria à criação de uma oligarquia capaz de nos impor unilateralmente suas vontades?
A resposta a todas essas perguntas sensatas é um sonoro 'não', e o motivo está vinculado ao conceito de autoridade política.
A autoridade política
Por que a maioria das pessoas aceita e legitima que o estado faça coisas que, caso fossem feitas por agentes privados, seriam vistas com horror?
Por exemplo, a maioria das pessoas vê com naturalidade que o estado cobre impostos dos trabalhadores e distribua esse dinheiro para ONGs, artistas e movimentos sociais, mas consideraria uma aberração caso uma turba invadisse uma casa, tomasse a carteira do morador e desse esse mesmo dinheiro para ONGs, artistas e movimentos sociais.  Igualmente, a maioria das pessoas vê com naturalidade que o estado restrinja — por meio da burocracia, da alta carga tributária e das licenças ocupacionais — a liberdade de empreendimento das pessoas, mas consideraria uma aberração caso um grupo qualquer, de maneira idêntica, também coibisse outras pessoas de empreender.
Por fim, a maioria das pessoas vê com naturalidade que o estado conceda monopólios e reservas de mercado (via agências reguladoras) para grandes empresas, mas consideraria uma aberração caso empresários se auto-arrogassem esses privilégios.
Por que então toleramos que o estado incorra em atividades que condenaríamos de imediato caso fossem executadas por indivíduos?
Porque, como bem explicou o filósofo Michael Huemer no livro  The Problem of Political Authority, o estado usufrui autoridade política.  Autoridade política seria a legitimidade política socialmente reconhecida ao estado para impor leis e usar a coerção sobre a sociedade (sociedade esta que, por sua vez, tem a obrigação política de obedecê-lo).  Segundo Huemer, embora a autoridade política seja limitada territorialmente (um estado possui autoridade política somente dentro de seu território), ela é total dentro deste território (todos, ou quase todos, os cidadãos são obrigados a obedecer ao estado).  Adicionalmente, o estado teria a legitimidade para legislar sobre diversas questões e o conteúdo dessas legislações seria quase ilimitado.  Por fim, trata-se de uma exercício de supremacia, pois, dentro deste território, não há nada que esteja hierarquicamente acima do estado.
Neste sentido, podemos definir o estado como aquele ente ao qual a imensa maioria dos cidadãos concede e reconhece autoridade política.  O estado, portanto, pode fazer o que faz porque o conjunto da sociedade aceita lhe conceder um vasto poder discricionário — poder este que a sociedade concede somente ao estado.
Os políticos "patrimonializam" autoridade política
Ao menos no Ocidente, os lobbies, os grupos de interesse e os empresários carecem de autoridade política.  Se a possuíssem, poderiam atuar à margem do estado, e consequentemente não teriam de exercer essa onerosa intermediação sobre o estado.  Se a possuíssem, poderiam por conta própria fechar mercados, criar monopólios, impor tarifas de importação, estipular licenças ocupacionais, e auferir subsídios para si próprios.
Obviamente, portanto, os lobbies, os grupos de interesse e os empresários carecem de autoridade política para exercerem, sozinhos, todos estes despautérios.  A sociedade não aceitaria que nenhuma empresa ou associação de pessoas se arrogassem tais poderes.  E, justamente por carecerem de autoridade política própria, os lobbies, os grupos de interesse e os empresários encontram apenas uma única via para exercê-la em proveito próprio: valendo-se da autoridade política que possui o estado.
E é exatamente a isso que se dedicam: a exercer pressão sobre os mandatários, a quem os cidadãos reconhecem autoridade políticas.  Em outras palavras, os políticos terceirizam os direitos de uso de sua autoridade política no mercado negro dos lobbies e das propinas: aquele grupo de interesse ou aquele empresário mais pujante receberá o favor do político correspondente.
A estratégia dos políticos, portanto, consiste em "patrimonializar" a autoridade política que a população lhe concedeu.  O político capitaliza essa sua autoridade e a arrenda a quem oferecer mais.
A solução libertária?  Limitar enormemente (ou até mesmo eliminar) a autoridade política que socialmente concedemos e reconhecemos ao estado.
E se o estado não possuísse (tanta) autoridade política?
Se o estado deixa de dar subvenções aos lobbies, aos grupos de interesse e aos empresários bem conectados, estes não irão adquirir autoridade política para cobrar privilégios da sociedade.  A sociedade é perfeitamente capaz de se auto-coordenar perfeitamente neste quesito.  Não é necessário haver uma "autoridade política que determine a transferência de renda de grupos menos organizados para grupos mais organizados".
O mesmo é válido para todas as hiper-regulamentações estatais que atualmente beneficiam grandes empresas e grupos de interesse.
Em definitivo, minimizar o tamanho do estado — deixar de lhe reconhecer autoridade política sobre várias atividades que hoje ele exerce — não implica maximizar o poder dos lobbies, dos grupos de interesse e dos grandes empresários, mas sim minimizá-lo por igual: tais grupos carecem de autoridade política para exercer coerção sobre a sociedade e, por isso, têm de instrumentalizar o estado (que no momento usufrui essa autoridade) a seu favor.
Diminuir drasticamente o estado não é sinônimo de repartir o poder político, mas sim de diminuí-lo.  A sociedade livre pode se autocoordenar internamente por meio da propriedade privada individual, das co-propriedades coletivas e dos contratos voluntários.  Se muito, pode-se ter uma autoridade política ultralimitada que se encarregue exclusivamente de velar pelo respeito aos contratos, mas nada mais.
Esse é, portanto, o caminho para se lutar contra a corrupção, contra os grupos de interesse e contra os lobbies empresariais: reduzir ao máximo o tamanho do estado para que se permita a pacífica, cooperativa e espontânea coordenação interna de uma sociedade.
Com estado grande, intervencionista e ultra-regulador, lobbies, grupos de interesse e subornos empresariais sempre serão a regra.